Depois de uma década de luta solitária para garantir dignidade aos filhos com microcefalia causada pela epidemia do vírus da Zika, muitas mães agora vivem um novo pesadelo.
Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou, há pouco mais de um mês, o pagamento de uma indenização de R$ 50 mil, em parcela única, e uma pensão vitalícia às famílias afetadas pela epidemia de 2015, algumas mulheres denunciaram ter sido alvo de coação de parentes e ameaças e perda de benefícios concedidos por prefeituras.
O Diario de Pernambuco ouviu, nesta quinta (16), mães que afirmam estar sofrendo pressões de ex-companheiros e familiares, além de retaliações por parte de prefeituras, que teriam cortado transportes e suplementos alimentares destinados às crianças com deficiência. Os casos foram informados ao Ministério da Previdência Social, mas até o fechamento desta edição, a pasta não havia se pronunciado oficialmente a equipe de reportagem.
“Depois desse dinheiro, depois de dez anos, ninguém nunca me ajudou. Sempre fui eu sozinha, em hospital, em cirurgia, cuidando dele. Agora que vai sair o benefício, todo mundo aparece querendo tomar a guarda”, desabafa uma mãe pernambucana de 26 anos, que prefere não ser identificada por medo de represálias.
Moradora da Região Metropolitana do Recife, ela relata viver sob ameaças constantes da avó paterna da criança, que teria dito que acionaria a Justiça para assumir a guarda do neto. “Ela me humilha, diz que vai me botar para fora de casa. Eu não tenho para onde ir. Moro com o pai dele, mas quem me ameaça é a mãe dele. Eu criei meu filho sozinha desde o nascimento, e agora que ele vai ter direito a uma vida melhor, querem tomar ele de mim.”
A criança, de 10 anos, nasceu com microcefalia, luxação nos quadris e escoliose, e depende totalmente da mãe. “Desde meus 16 anos eu dedico minha vida a ele. Nunca trabalhei, porque não posso deixá-lo com ninguém. O benefício vai me ajudar a dar dignidade, comprar o que ele precisa, mas vivo com medo.”
Outro relato obtido pela reportagem expõe o reaparecimento repentino de pais ausentes desde o nascimento das crianças. Uma mãe, separada há quatro anos, contou que o ex-companheiro, que nunca pagou pensão regularmente, voltou a procurá-la assim que soube da indenização. (Diário de Pernambuco)